quinta-feira, 30 de junho de 2011

63 - MINHA IRMÃ FRIDA…..................

Pintura; MONSARAZ, de Ana Rita Janeiro, ou "Carlota".


Quem atravessa as ancestrais terras d’el-rei em direcção ao grande lago, não raramente, depara-se com uma paisagem inolvidável.

Uma dúzia de quilómetros à nossa frente, pairando sobre um manto de nuvens ou nelas acoitada, a visão encantadora de Monsaraz, a vila medieval onde nasci.

Humberto me chamaram, porque nos idos de trinta, um aventureiro dos biplanos, ou triplanos, por arbítrio do mágico nevoeiro, trágico fim encontrou ao despenhar-se de encontro à torre de menagem do castelo, cousa que fatalmente muito consternou a populaça, antepassados meus incluídos, tanto que no baptizado do meu padrinho lhe mudaram o nome de Benvindo para Humberto, numa solene e compungida homenagem ao louco da máquina voadora, acabado de perecer no exacto momento em que o tão desejado Benvindo ao mundo vinha.


Humberto ele, Humberto eu anos mais tarde e por sua inteira vontade, tradição que mantive ao dar, por minha vez, o mesmo nome ao meu primeiro e único filho. Luís Humberto.

Mau grado estes recuerdos, a vila fica na raia Espanhola com o Guadiana de permeio (embora agora naveguemos nas mesmissímas águas turvas europeias), recuerdos que tento não olvidar apesar de tristes, pois retenho dessa vila e da minha criancice gratas imagens e muitas vezes me revejo largado à solta num castelo a que mais parecia somente poder aceder-se trepando um feijoeiro gigante, tal e qual como nos contos de fadas.

Não há contudo estória sem o seu senão… e o meu é a saudosa lembrança de minha irmã Frida, que vagamente recordo pois cedo foi roubada ao meu convívio, mas que contudo viria a ter na minha vida uma influência crucial, e superior à que quaisquer outros entes vivos sobre mim tivessem tido.

Não choro quando a recordo, para ser franco até muito mal a recordo, dada a tenra idade com que foi arrancada ao meu convívio, apesar dos emplastros de papas de linhaça com que porfiaram acudir-lhe. Sem qualquer resultado já se terão apercebido.

Nessa época a tuberculose ceifava às cegas, e os ditos emplastros a tudo acudiam, aplicados bem quentes e rigorosamente substituídos mal arrefecessem. 

Junto ao coração para males de amor, na testa para febres funestas, no peito para gripadas e outros males sezões, na cabeça se contra o mau olhado a inveja ou os esconjuros, caso em que se devia acompanhar a mezinha de um relicário colocado sob o colchão da paciente, ou de um escapulário pendurado em permanência do pescoço da protegida durante toda a cura, e, no caso, contendo rabos vivos de lagartixa verde, unhas de osgas e asas de morcegos, tarefa de que minha avó Inácia me incumbia a mim sempre que necessária, alegando que a ela, tocar em aves e bichos lhe dava voltas ao estômago e até galos lhe haviam já cantado nos intestinos.

Nunca chorei, como vos disse, a morte de minha irmã Frida, todavia bastas vezes as lágrimas me acudiram aos olhos se calha contemplar-me, eu, a mim, que sou obra dela e a ela devo tanto e muito do que sou, quem sou e como sou.

Já na grande cidade para onde ainda na infância me mudaram, achei, quando rebuscava não lembro o motivo as gavetas de meu pai, um livro cuja ilustração de capa aqui vos deixo, livro que despertou a minha curiosidade infantil pelas cores exóticas e apelativas que encerrava e em simultâneo mostrava, mas sobretudo pelo nome nele inscrito, “ Frida “.

Foi assim, quase como um livro proibido que uns anos mais tarde o li. Essa foi somente a primeira biografia da minha vida, acredito ter lido quase cem antes dos vinte seis e perto de duzentas até ao presente.

Deste modo insólito soube da morte de Frida, a tal que dera o nome à minha saudosa e tristemente falecida irmãzinha. 

Mais tarde, juntei dois mais dois e de meu pai entendi a admiração pela pintora que, como ele, viveu engajada numa doutrina que então guiava o mundo mas que anos antes de meu paizinho falecer lhe deixaria a tristeza estampada no rosto, tristeza que hoje culpo por mais cedo me ter roubado a sua companhia.

Fiz-me homem lendo, mor das vezes verões inteiros, debaixo de um fresco e frondoso chorão no jardim público da minha cidade, rés do lago onde plácidos cisnes ainda navegam, biografias e outras obras que a Biblioteca Pública para ali acarretava nas tardes de estio.

Comecei assim, guiado por minha irmã Frida leituras que me levaram, qual príncipe, de menino a homem, sendo hoje rei de mim mesmo e do mundo que me cerca porque acredito piamente que a alma da minha irmãzinha me conduz e protege os passos os caminhos e os destinos, pois no amor há muito que de mim cuidam com o mesmo desvelo por mim aprendido e, de tão amado, sinto insuflar-se-me o coração, e por sua vez ele um castelo, de muitas janelas e mais entradas ainda que o de um príncipe encantado.

A ti irmãzinha do coração e que sempre por mim velaste, o meu eterno amor e emocionado apreço, o meu reconhecido agradecimento.

A ti confesso quanto lamento quem, como eu, não teve alguma vez nem que por um instante só, uma irmãzinha como tu.

Descansa em paz meu amor.










                          minha mãe :) 





terça-feira, 28 de junho de 2011

62 - Esse teu olhar...



Esse teu jeito de olhar...


Através ou por sobre os óculos
Invisível, indescritível
Que fala e se cala
Se oculta e revela
Que desvenda e desnuda
Encanta e desencanta
Dissimulado, indefinido...


Esse...é o olhar do meu amor.

Ah, que olhar!
De suave armadilha
Que apalpa e acaricia.


Ousa e abusa
olhar de festa e magia
Insinua, inquieta
É uma melodia na minha vida.


É o olhar do meu amor...

Será que seus olhos são grandes

ou arredondados?


Pequenos ou semi-cerrados
Amendoados ou arregalados
Castanho, verde ou azul ?


De que forma, brilho ou cor
Nuance, matiz ou.... multicolorido?


Violáceos, vermelhos...não... entretanto,
Combinam com seus cabelos brancos?


Ai, ai! Esse olhar do meu amor...

Como será o teu olhar?
Apoteótico ou hipnótico?
brilhante ou fascinante,
Magnético ou metafísico,
Intenso ou matreiro
Como de um arguto leopardo
Ou de um cachorro abandonado,
De um gato esfomeado
Ou de um peixe morto?


sim.. são os olhos do meu amor...

Olhar mundano, volúvel
Que revela monólogos infinitos,
Feito de pequenas continhas
Pequenas estrelas
Pequenos faróis na noite
Que se iluminam ao som de Brel e Elis,
São olhos que me fazem feliz.


Ah! Os olhos do meu amor...

Se soubesse...ah !

se eu soubesse...


Devem ser vivos, de puro desejo
Deixar-me-ia seduzir por sua luz
Neles me arrebataria e repousaria
Acastelar-me-ia em seus sonhos
Nas sombras e beleza das flores,
E nesse olhar amanhecido
entregaria a minha paz.



É... o olhar do meu amor...  

Em, 12/08/2009 - Nilza Rouquentin 


sábado, 25 de junho de 2011

61 - COMO DA PRIMEIRA VEZ...................................


               
              Como da primeira vez, ainda ambos adoramos esse ritual que, volta não volta, quase tornado brincadeira já, nos coloca em papéis e posições que diariamente estamos longe de assumir.

Compreensivelmente, nem ela é sedutora ou manipuladora, nem eu o dominador possessivo que aliás nunca fui.

Ela percebe-me, adivinha-me o pensamento, e de tal modo assume os meus desejos que, langorosa avança, rebocando-me atrás de si, olhando-me deleitadamente e impedindo que, à última hora me arrependa ou mude de intenções. Ambos adoramos, como da primeira vez, esse ritual carinhoso e em simultâneo purificador.

Enquanto eu apalpo a água até que a sua tepidez se torne agradável, ela senta-se sobre as pernas, nunca deixando de me olhar com aqueles olhos lindos, de gata, numa expressão de prazer adivinhado a que eu nunca soube resistir. Um olhar dela e a qualquer hora, em qualquer lugar, me apresso a satisfazer-lhe rapidamente os desejos e os caprichos que de uma forma clara exprime tão solene quanto encarecidamente.

Tantas e tantas vezes apenas um olhar basta, tal a cumplicidade que entre nós se gerou.

Estás sentada sobre as pernas, cabeça levemente inclinada para trás, olhos semicerrados, enquanto te apoio as costas e seguro a ponta do chuveiro buscando não te deitar água nos olhos, sei que o detestas, tanto quanto eu adoro dar-te banho.

E, enquanto lânguida respondes aos meus gestos, te espalho o champô pelo corpo, suave, suavemente, sem brusquidão, a mão passando levemente por ti, afagando-te o peito, descendo para o ventre, também eu apreciando o doce tacto dos teus pelos sedosos e macios que a água morna amoleceu.

Não insinuas um gesto, ali ficas, estática, gozando o prazer do momento, adivinhando o próximo, em que, nos braços te tomando, num cobertor felpudo e quente te embrulharei com carinho, com amor, resguardando-te do frio, embalando-te num sono que se tornou hábito e que durará até que, seca, emirjas bocejando como bebé libertando-se da placenta.

E sim, como sempre ali estive, ali estou, esperando o teu despertar, que ocupes o meu colo, que deites a cabeça no meu braço, que o ritual se cumpra do início ao fim, sem alterações, como gostas, como os hábitos, quais direitos adquiridos, exigem agora.

Estendo-me ao comprido e a teu lado no sofá, também eu sem sono mas gozando esse momento único, beijo-te a nuca, mordisco-te a orelha, enlaço-te com os meus braços longos e fortes e aperto-te até libertares o habitual suspiro, sinal de que basta, um pouco mais e deixarás de achar graça à brincadeira.

Ali ficamos, uma vezes minutos, outras horas, é sábado, ninguém nos virá desta incomodar, os olhos pesam-me, o teu calor amolece-me, a sesta chama-me, sinto as pálpebras fecharem-se-me num abandono que amparo, dormimos e sonhamos.

Uma vez mais como habitualmente te libertas sorrateira, sem que dê por tal senão quando pulas repentinamente para o chão, me olhas com carinho e com desdém e, altiva, o rabo que nem antena de automóvel, no passinho miudinho e gracioso que sempre foi o teu desde que em minha casa te acolhi, buscas a tigela do granulado, sempre recheada, ou o leite para gatinhos que tanto aprecias.

E eu, que a ninguém confesso quanto amo a minha gata nem quanto ela me ama a mim, fico vendo-te esperares-me, pois há muito sei não comeres sem a minha presença e o velho afago no dorso. 

                     És o meu amor Shamira !

És o lindo amor do dono !

                





MANITAS DE PLATA ...............................................


O mote para aquela conversa macabra às duas da manhã foi a Vitorinha, amiga comum, costureira em Limoges durante muitos anos e mais tarde dona feliz de um ateliê próprio de corte e costura em Bordéus, depois de haute coture, e posteriormente de moda, um mérito seu, dela, e que explorava paredes meias com um “bistrot” também orientado por si mesma, com petiscos e comida exclusivamente portuguesa, e cujo desempenho media meças à alta-costura ou aos caros restaurantes gourmet. Dois negócios de sucesso que a tornaram conhecida em Bordéus e todo o sudoeste de França, pela originalidade da sua costura, motivos, traço, corte e cores, e claro pela inimitável gastronomia, coisas que a deixaram podre de rica e para as quais tinha um sexto sentido e mãos de fada, agora ali jazia e a ela dedicávamos as nossas memórias e uma última e sentida homenagem.

Para ser franco mãos de fada foi a primeira coisa que, muitos anos antes a tornara conhecida entre nós que depressa a baptizáramos de “manitas de plata”, um ápodo malicioso fruto da nossa irreverente juventude. O melhor será contar-vos a história desde o princípio pois de outro modo correrei o risco de não me fazer entender e vocês leitoras e leitores ficarem com uma ideia deturpada da figura magnânima que foi a minha amiga Vitorinha. Tão rica ficou que comprou uma residencial no Algarve, que explorava com mestria e para onde durante mais de vinte anos me convidou a passar férias, completamente gratuitas, as quais somente recusei quando as filhas, já crescidas e talvez estranhando a devoção da mãe, me passaram a chamar Lázaro e a citar por tudo e por nada passagens do Evangelho segundo S. Lucas*… (16:19-31) tempo e vezes suficientes para que eu tivesse entendido a alusão ao leproso e, desaparecido de vez da vista delas…

Mas a vera história começa assim, era uma vez eu há muitos muitos anos, basta lembrarmo-nos que passei há pouco dos cinquentas e tais, a mesma ocasião em que a Vitorinha comemorara os sessenta e tantos. Eram tempos em que não havia “ERASMUS”, o que todavia não obstou a que houvesse intercâmbio de jovens, nessa altura era a igreja católica através da JOC, Juventude Operária Católica, organização inserida na rede de redistribuição da riqueza pelos cristãos, quem patrocinava a troca, a permuta, o estabelecimento de relações recíprocas de ordem cultural, comercial e social entre nações ou instituições. 

Foi assim que muitos de nós conhecemos Paris, Bruxelas, Roma, Liége, e, nesse ano memorável os Pirenéus e o Santuário de Lourdes, férias cujo final decorreu no lacustre vilarejo de Lanuza, província de Huesca, já nos Pirenéus Espanhóis, vivenciando o Festival Pirenéus Sur** que hoje sim é famosíssimo, ainda que tenha perdido o glamour desses dias em que a acção católica, o voluntariado, a nossa juventude e irreverência tenham enriquecido de modo especial e inesquecível a experiência e a vivência dessa vertente missionária da formação, a qual posteriormente viria inclusive a condicionar alguns aspectos da minha vida, das minhas relações e amizades, quiçá do meu futuro, embora à época eu estivesse longe de prever a amplitude ou dimensão de que a coisa se revestiria.

Eram tempos de camaradagem, solidariedade, entrega e dádiva e cuja prática e formação buscavam inculcar em nós hábitos de protagonismo católico na perspectiva de nos alimentarem a fé e conduzir à aceitação da submissão a todos os dogmas cristãos e aos caminhos da devoção, no fundo a matéria de que se revestia a ortodoxia a cuja lavagem ao cérebro era suposto submetermo-nos.

Era tudo muito bonito mas na prática a teoria era outra, como toda a gente sabe e muito bem nos fazia entender a subversiva Vitorinha que, com mais meia dúzia de anos que a maioria de nós, facilmente impusera o seu estilo peculiar de liderança, até por recorrer a argumentos discutíveis mas que nenhum de nós ousou contestar, nenhum não será bem verdade, existia o Cláudio, a quem desde pequeno reconhecíamos os traços de mariconço que mais tarde o levariam às manifestações do dia do orgulho gay e que nunca se deu bem com ela apesar da Vitorinha ser bastante tolerante, aqueles dois sempre foram aliás como o cão e o gato, coisas que já lá vão e o melhor é esquecermo-nos delas, porém eu não digo o mesmo porque a Vitorinha punha e dispunha de nós a seu bel prazer e apesar disso conseguiu agradar a todos, e se não a todos pelo menos à maioria, menos ao paneleirão do Cláudio, hoje com mais direitos legais mas com menos amigos verdadeiros pois a verdade verdadinha é que não somos todos iguais e entre as mãos dele e as manitas de plata da Vitorinha imagino uma distancia colossal, que nunca vi nem quero ver mas creio firmemente seria abissal.

Católica praticante, desde muito cedo Vitorinha nos fez saber, a todos à vez e a cada um em particular, que nem sonhássemos com certos excessos, queria casar de vestido branco, com véu e tudo, e sobretudo virgem, e casou mesmo virgem ! Ao mesmo tempo que nos fazia revirar os olhos afirmava com doçura ter umas mãozinhas e uns dedinhos de fada, uns dedinhos de bradar aos céus, e não é que tinha !

Muita da experiência sexual que adquiri entre os meus quinze e os dezasseis ou dezassete anos agradeço-a à igreja e a esse “ERASMUS” cheio de misticismo que ela patrocinava. A própria imagem da mulher foi para mim ganhando uma expressão sagrada na exacta medida em que me tornava homem e, se até aí vira as mulheres como iguais, todas iguais, a partir de Vitorinha passei a conhecê-las, observá-las, admirá-las e apreciá-las pelo que cada uma tem de particular, de específico, e nalguns casos de sobrenatural.

Assim fiquei devendo imenso à Didinha, a quem dava gosto ouvir falar pois tinha uma boquinha de sonho, a quem nunca mais vi mas acredito tenha vindo a ser professora como ela tanto desejava e acredito-a boa oradora em seminários, workshops etc., onde, com a ternura que lhe conheci, divulgará junto dos desafortunados da sorte e dos pobres de espirito a palavra de Deus, tal qual nessa altura fazia ao prender-me às suas prédicas e práticas sem a mínima objecção, antes agradado e agradecido por ser o escolhido a sentir-me no céu, quando não a ver estrelas. 

Ou então, como esquecer uma enorme divida de gratidão para com a Cilinha ? A minha grande devoção pela Cilinha foi outro exemplo de fé, de perseverança, de entrega, magrinha, delgadinha, violinha, um corpo santo, perdão, um corpo são e uma mente sã, de entre todas aquela que indiscutivelmente e em qualquer aspecto se assemelhava, (benditos filhos e marido que tal mãe e mulher têm) e assemelha, no perfil, no cândido rosto e pureza da alma, a uma santa e de cujo leito um homem se erguia como que saindo da ressurreição e pronto a combater todos os pecados do mundo.

Beleza era o silício com que essa santa me subjugava, numa dominação que não só lhe consentia mas que eu procurava, porque o céu era ela e a redenção estava ali, bastava para tanto comer o fruto da árvore proibida, da árvore da vida e da alegria, e juro-vos, nunca uma maçã me soubera tão bem, ou outro pomo eu vira ou veria na vida mais bonito que o seu, quero dizer que o dela, o qual me tentava tal qual a serpente tentou Adão no Paraíso e, como ele, eu cedi, cedi à tentação e não morri, fui bafejado pela sorte, fui abençoado, fui iluminado, e então, precisamente quando o PREC tentava fazer com a Acção Cristã o que a República fizera com o clero meio século atrás, eu comemorei o meu vigésimo aniversário, cresci, ela a santa igualmente, e todos nós nos obrigámos a um recolhimento pragmático como os cristãos se haviam recolhido às catacumbas dois mil anos passados.

Mas juro-vos, juro não estar esquecido da fé que nos animava e que a minha devoção continua, intacta, disponível e mais forte que nunca pois se a palavra de Deus tem o dom de nos tocar, a sua divina vontade faz-nos ver estrelas, ver a luz, 

é isso, FIAT LUX !!!!


https://youtu.be/Eex1aqbfP08

Panorâmicas de Lanuza, em várias fotos pode ver-se o cenário e o palco onde decorreu e decorre anualmente o " Festival Musical Pireneos Sur " : https://www.google.pt/search?q=lanuza&espv=2&biw=1024&bih=643&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwivwKuNxtbJAhVJvhQKHRinD5oQ_AUIBigB



                        * Lugar de Lanuza (Pirenéus, Huesca, Espanha)





quarta-feira, 22 de junho de 2011

60 - MINHA AMIGA TERRÍVEL E LOUCA ...............



              Engatou aquele sorriso irónico que se lhe adivinha nas fotos e senti-a disparar-me um;

– Porque és parvo, e só o és porque queres, que tens ganho com isso, já tens idade para ter juízo.

E calou-se, deixando-me com o menino nos braços. A mim, o pretenso e apurado equilibrado ajuizado, o parvo.

Falava-me de uma forma despretensiosa, alheada de uma realidade que nem era dela, nem na interrogativa nem na afirmativa, diria antes que o fazia de um modo sarcástico, mas verdadeiro, custando-me engolir-lhe as palavras, palavras que de bom grado faria engolir a qualquer um outro boca abaixo, com dentes e tudo à mistura.

Mas não a ela, não aos amigos, esses têm carta de alforria para tudo que lhes apetece dizer-nos.

E se não a eles, a quem ?

Curiosa a paciência com que tudo lhe aturo, lhe suporto. Curioso o modo como nos conhecemos, nos descobrimos, e sobretudo como, nesta selva estéril, fizemos da nossa amizade um exemplo de respeito, tolerância, confidência e confiança. A amizade é um prodígio, se alimentada grassa com a força das ervas daninhas mesmo no terreno mais árido. 

Surpreendeu-me a possibilidade tornada veredicto. Bastou querer, tão simples como isto ! Ainda hoje me surpreendo, e alimento essa amizade, falo-lhe mesmo, como soa dever fazer-se com os animais e as plantas. Ao principio de um modo exuberante e em simultâneo duvidoso, ou desconfiado, agora com uma placidez que insufla paz às almas, numa reverencia castradora dos mais ignóbeis motivos, como que numa solicitude de leproso perante a promessa ou o anunciado milagre de uma cura. 

E descobri-me a mim nela, e em mim ela se descobriu, como se duas nebulosas no firmamento, jamais concebendo que fenómeno idêntico pairando na galáxia, se tivessem tocado de raspão e, qual beleza do universo, rodopiando como um par de braço dado, nos estivéssemos transformando numa unidade só, um só pensamento, uma só identidade, e, quem sabe se daqui a uns séculos seremos lembrados como Andrómeda, Magalhães ou outro qualquer nome assim simpático, e não já a nebulosa em que inicialmente nos envolvemos, tornámos e fomos, sempre alimentando esta amizade com a mesma arte e destreza com que no espaço em que vogamos evitamos os buracos negros e a sua incrível força de atracção, que tudo suga na sua proximidade, tal qual como nesta terra, indiferença e vitupérios ostracizam ou arrastam na lama os mais crédulos e fracos.

Amo a louca à minha maneira, num amor nem carnal nem espiritual, antes um amor figadal (fui ver ao dicionário, profundo, intenso, íntimo), mais emanescente de uma identificação mútua e daquilo a que chamamos a nossa cara-metade da amizade, que dos pecadilhos confessados ou das intenções que a isso nem chegam.

Só por isso, na sua inocente ingenuidade de menina má, a escuto com a atenção que qualquer louco me merece, ou não soubesse eu como se disfarça e onde se esconde a loucura, apenas que não em mim, e não nela, mas até nas personalidades mais bizarras e nos caracteres mais sombrios, como aqueles que apenas podemos imaginar, vislumbrar, suspeitar ou com alguma sorte descortinar nos “curriculuns” mais extensos, exuberantes, pormenorizados ou pesados, que esta coisa de uma pretensa existência e posição tem os seus quês e porquês, e nem o peso é critério despiciendo, por isso aqui deixo o meu testemunho do quanto prezo a minha amiga louca e a sua loucura, ciente de que nem ela nem eu estamos loucos, antes amigos, ligados por uma amizade que só a loucura do mundo aproximou e alimentou, pelo que grato estou, e nem imaginam quanto, a tanta e tanta individualidade séria, sóbria e culta que me rodeia ainda que nem dê por isso, e, duvide até, que alguma dessa gente esteja ou seja viva, mais crente estando que vivam sem se dar conta de tal ou, no pior dos casos, tenham morrido sem dar por isso. 

Beijinho amiga.


terça-feira, 21 de junho de 2011

59 - SONHO............................................




Tristes e breves são as nossas vidas.
Senti naquela noite que se finava, um estranho pressentimento, e, no ar, a aura de uma força singular, uma extrema diferença na percepção do espaço e do tempo, que me pareceu momentânea e maravilhosamente em suspensão.
Divisei cândido sorriso vogando num sonho metendo nuvens, rios, arbustos e flores, e tão doce, tão doce que, docemente me deixei levar, permitindo a essa impressão vogar, deixando-me lembrar e esquecer, recordar.
A janela do quarto aberta, o encanto da manhã orvalhada arrefecendo-me o corpo suado e, sobre mim, a bênção da Lua reflectindo-se igualmente nas pedras.
O cheiro da lareira apagada, o reflexo das estrelas, a realidade longe da vista e da consciência, a mente e o corpo à deriva, clamando paulatinamente por guarida.
E sonhando me deixei ficar, levar pela emoção dessa sensação que me chamava, por esse inconsciente e profano argumento que sub-repticiamente me seduzia.
Fiquei quieto, e, inquieto perante esse estranho fulgor que me banhava, essa misteriosa e maravilhosa luz que me cegava.
Sonho e realidade confundiam-se-me no espírito, divisei vela dourada ardendo e o odor forte de fragrâncias inolvidáveis.
É um momento terno e eterno, forço o seu prolongamento, enrolo-me no doce calor do amor pressentido e no cheiro que se evola e me põe em suspensão.
Pressinto no ar memórias e desejos, uns lábios selando este segredo que encolhido e receoso guardo e alimento.
Ignoro o onde e o quando, apenas me sinto, embalado em ternura, chega-te a mim, abraça-me com violência, dedilha os cabelos do meu peito, eu te quero no meu caminho, agora e sempre, que mudes este meu destino.
Por ti meu coração expia amor, não me abandones, que morro, antes me enganes, porque com lágrimas te lembrarei sempre, amor, que por ti expio uma paixão e amor sinceros.
Cinge-me com força, por Deus, rende-te aos meus braços, olvida em mim uma vida em sofrimento, sei que voz estou escutando, a tua, ciciando quanto me queres, e eu quero-te, testemunho com minhas lágrimas quanto te amo, e quero-te com compulsão e virtude, entusiasmo e pujança, causa, motivo, necessidade e intensidade, mas, acima de tudo, amar-te.  
Teu semblante indecifrável surgiu na minha mente, nem sei se era loucura ou violência o que marcou um lençol e um sudário, sei que foi sensação que durou e, quanto durou nem sei, sei que dentro de mim se demora, nem quanto tempo passei sem saber o que sei hoje, em que, feliz, já nem lembro o que sonhei.
Apenas esta doce e suave sensação, esta lembrança, recordação e saudade.
Delícia.
Sonho.



domingo, 19 de junho de 2011

58 - QUERIA OFERECER-TE UM RAMO DE CAMÉLIAS...




Eu queria oferecer-te uma flor amor, uma flor que cantasse um anseio, um receio, uma flor que encerrasse intimidades, lembranças, que te levasse puras e quentes, palavras ardentes.

Eu queria viver sempre em melodia, eu queria que não tivesse fim o dia, eu queria estar contigo agora, sempre, queria ser teu confidente, contar-te que sou alegria, gente.

Não esquecerei os teus olhos, o teu sorriso, se sinceros.

Eu queria oferecer-te um ramo de camélias, e corri doido, por floristas, campos e revistas, sem que em parte alguma o alcançasse, por isso pensei, que pétalas pudessem florir dos meus braços e cobrir-te, que o seu aroma preenchesse espaços, te fizesse rir, sorrisses…

Imagino o teu cabelo em desalinho, a tentação de o querer domar, só porque não quero que esconda um rosto lindo, cujo sorriso me fará sentir bem-vindo, e querer ao pé de ti ficar.

Sou aquele que mente, pensas tu, mas sou já crescido, gente, em que vive um coração que sente, alma temente, sonho persistente, atrevido e consciente, que o tempo ensinou a ser sincero.

Voo por cima dos meus pensamentos, sonho acordado, monto o cavalinho, parto à desfilada, delirante, e só a tua lembrança me acalma o caminho errante, me faz tornar à terra de mansinho.

Queria imaginar-te a meu lado prazenteira, e esse momento fosse de festa, bebedeira, ter-te comigo p’ra me consolar, para conspirar, guiar na cegueira, sossegar em mim esta canseira.

Canseira de incertezas e temores, de não poder sonhar-te eternamente, receios e pesadelos de perder-te, medo de procurar-te em vão e não te achar, olhar, não te ver e te chorar.

Vivo inquieto, imagino-te, e tudo me parece um sonho lindo, céus multicores, cheirinhos a mil flores, e irrequieto temo o sonhar findo.

Febril, em alvoroço, me ergo do sono, desvairado, procuro-te a meu lado, sento-me à beira da cama, angustiado, a noite profanada novamente me enleando no seu seio, deixando uma lágrima, um esteio, um esboço.

Um esboço que sonhei e se sumiu, que horrorizado vejo fugir do meu alcance, que temi perder, ficar distante, e foi essa saudade que uma lágrima traiu.


Não te escondas, não me abandones, não quero ficar sozinho neste mundo, serás tanto para mim, meu doce amor, não deixes que estoire no meu peito um grito agudo, porque para mim tu serás vida, tu serás tudo !



O TIRO DE MISERICÓRDIA QUE NÃO FOI DADO


O problema era mesmo o cheiro a sangue, se nada pior acontecesse a diversa bicharada deambulando faminta cinco milhas em redor dele se encarregaria de lhe dar fim, não de o estraçalhar pois estraçalhado já ele estava.

É daquelas coisas da vida que pensamos nunca virem a acontecer-nos, um tipo esquiva-se a morteiradas, bazucadas, paludismo e o que mais calhar, incluindo rajadas atiradas em jeito de despachar fogo e a que nos safamos como quem ginga com a sorte e, dias depois, arma ao ombro e julgando longínquo o perigo, avançando descontraidamente por uma picada, pisa-se uma mina, clic e pum !

Afinal não acontece somente aos outros, que merda de sorte, estou fodido, e agora ?

Se não fossem os bichos a dar com ele e a dar conta dele seriam os sul-africanos, por duas vezes já tínhamo-nos conseguido esquivar aos hélis, uma das vezes quase nos enterrámos na areia para não sermos vistos, sabíamos que não iriam desistir de nos procurar, tínhamo-los deixado suficientemente enraivecidos para que não pusessem de lado o prazer duma vingança a quente, o Mhuanha teria que desenvencilhar-se sozinho, que optar, que escolher, desde sempre o sabíamos, a guerra é feita de escolhas, qualquer guerra, nada de debates, de burocracias, nem opções inadiáveis, é antes feita de opções imponderáveis, imediatas, como no velho oeste, quem não sacasse primeiro morreria às mãos do inimigo.

Sabia-o qualquer de nós e sabia-o o Mhuanha, a vida decide-se ao minuto, um tiro certeiro do guerreiro e é a glória, um passo mal dado e é a morte do artista. Desfeito já ele estava, encostado a um penedo baixo, segurando com as mãos as tripas, ora apertando o garrote ora relaxando-o, enxotando moscas e mosquitos, leões, chitas, guepardos* hienas e mabecos seriam mais difíceis de enxotar, e se aparecessem os sul-africanos haviam de gostar de ouvi-lo falar, obrigá-lo-iam a falar, portanto o melhor seria guardar para si mesmo a última bala, se para a usar lhe dessem tempo e oportunidade…

Isso, tempo, o tempo seria doravante o seu pior inimigo, a terra, já de si avermelhada, escurecia e criava crostas empapada de sangue, a mesma terra que, como uma compressa lhe secava as entranhas expostas e lhe escondia a gravidade da situação em que se encontrava, tornando-a mais aceitável aos seus próprios olhos. Mhuanha sabia tão bem quanto nós não haver maneira de o levar dali até à base, muito menos chegar lá vivo caso teimássemos ou conseguíssemos carregá-lo, esperavam-nos pela frente três a quatro dias de marcha, a pé, isto se o despiste dos sul-africanos não nos obrigasse a rodeios que acrescentassem a esses mais dois ou três, em qualquer dos casos ele não resistiria, e sabia-o, não que alguém abordasse a questão, nem era necessário, ele sabia, já sabia, sempre soubera e sempre ignorara essa certeza, há coisas que nem ao diabo confessamos, esta era uma delas, chegara a hora, ele simplesmente se limitava a aceitar o destino o fim e a morte, nunca sentira medo na vida, só agora, via-o nos seus olhos mudos, na sua boca calada, nos dentes cerrados, no olhar resignado.

 Bande preparou-lhe o cantil, encheu-o de água, municiou-lhe a arma, ajeitou-lhe as costas contra o penedo e entregou-lhe mais três cunhetes de munições, todo o grupo se mantinha em silêncio, cada um olhando para dentro de si mesmo, Mhuanha olhando pra mim, implorando, a sua boca não se abria mas os olhos imploravam, percebi-o e fiz-me desentendido, ele sabe que sou cristão, católico, que a minha doutrina não mo permite ainda que eu seja um ateu herege. Socolo fez-me sinal com a cabeça, percebi pelo seu olhar que não se importaria de ficar, eram amigos desde crianças aqueles dois.

         Sem estrilho e em silêncio fomos partindo em dupla fila indiana, cabisbaixos, pesarosos, todos confiando que Socolo cuidaria dele até ao fim e todos ficámos atentos ao menor ruido, mas não houve ruido, não houve tiro, nem houve qualquer surpresa.

Vinte minutos depois Socolo juntava-se-nos. Ninguém disse nada, ninguém perguntou nada, alguém, não sei quem, nem perguntei, sussurrou entre dentes;

- Misericórdia

Eu ter-me-ia benzido, se tivesse fé.


                   * https://blog.rhinoafrica.com/pt/2018/01/30/guepardo-e-leopardo/

sábado, 11 de junho de 2011

57 - HORROR DOS HORRORES....



UM CAPITULO AO ACASO, UM CASO ENTRE MILHARES...    BAGDAD MARÇO / ABRIL DO ANO DE 2003

No percurso diário, do nosso sítio para os hotéis Palestina/Sheraton, passamos forçosamente, todos os dias, próximo à central telefónica que alimenta esta área da cidade.

É uma entre as muitas centrais desta metrópole gigante, precisamente aquela que nos canaliza para casa os telefonemas diários que, gratuitamente, a organização e o avanço da guerra ainda permitem efectuar.

Porém, o destino fadara mal aquele dia, aquela hora.

O velho autocarro avançava devagar, aos solavancos pelo trânsito super apinhado, como ele, também só velharias.

Repentinamente, à esquerda, estática sob o assobiar de uma sirene, som que em tantos de nós provocava autêntico mas diferenciado reflexo condicionado, uma mãe estaca hirta no meio de uma rua lateral.

Pela mão levava uma criança, caminhavam de mãos dadas, estugando os passos na pressa de cumprir o recolher e evitarem os acidentes dessa rua térrea.

Seriam umas vinte horas, mais minuto menos minuto, pois como veremos umas vezes um minuto não é nada, outras é todo o tempo do mundo que nos resta.

Um clarão, um estrondo enorme.

Depois de dissipada a nuvem criada, uma estrutura completamente esventrada.

Uma menina jaz no chão, a alguns metros.

Em frente, uma parede fica toldada de vermelho vivo, pedaços de mulher juntam-se aos destroços daquilo que fora uma central telefónica, numa rua super movimentada.

Onde somente o trânsito era caótico surgiu, inesperado, o caos.

O autocarro estanca, avança de novo, de novo os solavancos, depois pára.

No lugar forma-se um aglomerado.

A criança ficou estática, muda e de olhos fixos em coisa nenhuma, como se de repente tivesse perdido a visão ou o mundo tivesse deixado de existir para ela...

Instantâneo, o clarão deve ter cegado as duas, o estrondo da explosão, esse, só a criança o terá ouvido, se é que ficou em condições para tal.

Nunca mais nenhum de nós conseguiu qualquer telefonema para casa ou para onde quer que fosse, e perceberão porquê.

O velho autocarro que tomáramos para o nosso sítio, fugira ao trânsito desviando-se para essa rua secundária e esburacada quando, a cinquenta metros, a central telefónica foi atingida por um míssil, cientifica, diligente e cirurgicamente disparado, mostrando-nos que, se estávamos vivos, a esse desvio o devíamos.

Em redor, a destruição descomunal, pára por momentos a urgência de todos, só então reparamos que, nessa rua das traseiras, uma alva parede apresentava um rasto de sangue, terminando sumido na terra seca.

O corpo da mulher seria prontamente recolhido, a cabeça, que se separara do corpo, terá sido enrolada na mesma mortalha.

Uma criança ficara repentinamente órfã, de mãe e do mundo.

Disseram-nos que não chorara, que haveria de passar muito tempo até perceber o que se tinha passado, se é que alguma vez o estado catatónico em que ficara lhe permitiria entender esse minuto.

Talvez não, talvez fosse preferível que não.

Cumprindo ordens de populares que acorreram ao desastre subimos, o autocarro avançou de novo para libertar a rua aos bombeiros entretanto chamados ao local, e, porque um míssil nunca vinha só, pois já por que não raramente um segundo vinha emendar, ou confirmar a eficiência do primeiro, nada melhor que abandonar essa zona, e depressa.

Não por causa dos solavancos, cheio de náuseas, vomitei tudo e todos em redor.

Ninguém dizia nada. Ninguém disse nada.

Como nos habituámos depressa a esta normalidade.

É a guerra, dela nada há a esperar de bom, todo o mal é normal. 

Para trás, mau grado o risco que corriam, ficava um aglomerado que aumentava a cada minuto que passava, bradando a uma só voz contra o céu, esse lugar divinizado, em direcção ao qual ao longo de séculos ergueram as suas preces e agora lhes remetia crime e castigo. Porquê?

O mundo pode ser tão bonito, se quisermos.

Como é grande a força dos poderosos.

Já imaginaram quanto bem podiam fazer pelos mais fracos?

Uns morrem de operações cirúrgicas, outros de operações cirurgicamente planeadas.

Uns de ataques fatais, outros de danos colaterais. Nós portugueses, morremos em listas de espera, é menos chocante.

Sentimos que andamos sempre, se não com a tensão altíssima, no mínimo debaixo de grande tensão.

Quando chegarmos a casa, se chegarmos, todos prometemos tudo fazer para evitar males maiores e ajudar a todos no que puder e estiver ao nosso alcance.

Por aqui vamos fazendo o que podemos, as mais das vezes nada mais que não seja lamentar o que se passa, em especial nos hospitais.

Não entendemos já nem o que os nossos olhos vêem...


in "A Guerra No Iraque" A Experiencia Inesquecível de um Voluntário de Paz Na Tomada De Bagdad "
- Ed NossoFuturo - 2005 - Humberto Baião - ISBN 972-9060-31-2